9º Valor – Cultura de Honra

Abnério Cabral

Recentemente, o assunto de honra tem sido tratado de forma bem ampla em diversos livros lançados sobre esse tema. Desde o início da igreja, Deus vem trabalhando com o propósito de entendermos a importância de honrar uns aos outros. No Novo Testamento, encontramos um pouco mais de 50 versículos com a expressão “uns aos outros”. Paulo e os outros discípulos de Jesus insistem com a igreja para que os membros aprendam a voltar a atenção para os outros, para suas necessidades, lutas, fracassos e sucessos.

O próprio Jesus declarou que o profeta não tem honra em sua própria casa. Um centurião, ao encontrar-se com Jesus e lhe pedir que desse uma palavra sobre a cura de seu servo, reconheceu que não tinha honra suficiente para receber Jesus em sua casa (Mt 8.8).

Tenho pensado no que o apóstolo Paulo diz: “daqui por diante a ninguém conhecemos segundo a carne” (2 Co 5.16) e em outro momento: “nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado” (1 Co 2.2). Todos nós temos um aspecto humano que Paulo nos ensina a não enfatizar, pois podemos cair no erro de julgar uma pessoa de maneira errada, tanto de forma negativa (emitindo conceitos sobre alguém conforme os erros que o vimos cometer) quanto de forma positiva (de acordo com o que enxergamos erroneamente segundo a carne). Por exemplo, podemos falar que alguém é legal porque tem dinheiro, um carro bonito ou pela posição que ocupa (Tg 2.1- 9). Tanto os julgamentos negativos quanto os positivos que citei estão baseados em conceitos humanos, carnais, exatamente o que Paulo nos diz para não fazermos.

É necessário que aprendamos a reconhecer Cristo no irmão por meio da obra redentora do Senhor nele. O que Cristo fez na vida daquele irmão? Onde Cristo o colocou no Corpo? Como ele serve a Deus e qual é o seu ministério? Qual a graça que foi derramada sobre ele para edificar o Corpo de Cristo?

Cristo em vós

“a quem Deus quis fazer conhecer quais são as riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vós, a esperança da glória” (Cl 1.27).

Há esperança quando Cristo está em nós! É dessa forma que o Senhor nos olha e é dessa forma que precisamos olhar para os irmãos, com esperança, tratando-os com esperança, ensinandoos com esperança e exortando-os com esperança…

Precisamos aprender a honrar a graça de Deus na vida de nosso irmão. O princípio da honra que vem do Céu está baseado em quem somos no Senhor, no preço que foi pago por nós, na graça que foi repartida a cada um…

“Para que o nome de nosso Senhor Jesus seja glorificado em vós, e vós nele, segundo a graça de nosso Deus e do Senhor Jesus Cristo”

(1 Ts 1.12).

Existe uma graça derramada sobre nós! No versículo acima, Paulo diz que é a graça de Deus e do Senhor Jesus Cristo. Nós precisamos zelar por esta graça nas vidas ao nosso redor. Quando honramos uma pessoa, devemos honrá-la por causa da graça que está nela. Ela desempenha uma função no Corpo de Cristo por causa dessa graça que está nela. Por meio de Jesus Cristo, Deus fez um depósito de sua própria pessoa em nossa vida.

O Senhor, quando reparte os dons, faz conforme seu próprio discernimento, conforme sua própria vontade, e nós precisamos observar isso na vida de nossos irmãos (1 Co 12.11,18).

O apóstolo Paulo diz em 1 Coríntios 3.10 que ele lançou os fundamentos segundo a graça que lhe foi dada. Na hora de tratarmos uma pessoa, devemos observar a graça que está nela. Quando honramos alguém, seja diante de um público grande ou pequeno, deve sempre ser por causa da graça que está nela.

Durante um culto na nossa igreja em Jundiaí, tivemos um momento de reconhecer publicamente quatro irmãos como um Conselho Apostólico sobre o nosso presbitério local e sobre a igreja. Reconhecemos que esses irmãos receberam graça de Deus para corrigir os rumos, aconselhar quando estivermos desviando do alvo, propor direções e intervir quando necessário. Ao reconhecê-los, estávamos valorizando a história que tinham com o Senhor, o serviço prestado ao Corpo de Cristo na nossa localidade e fora dela e oferecendo-lhes honra pelos serviços prestados ao Reino de Deus.

Também temos em nossa igreja um irmão que trabalha como zelador substituto. Ele sofreu algumas complicações de saúde e não tem condições de voltar ao mercado de trabalho; porém, a Previdência não o aposenta. Nós o mantivemos como funcionário apesar de ser necessário contratar outro. Esse irmão é pontual e serve a congregação com alegria; sempre se dispõe a ser o último a sair, mesmo tendo sido o primeiro a chegar. Sempre que nos é oportuno, falamos diante da igreja sobre a importância do serviço do irmão e a alegria com que ele faz as coisas para cada grupo que solicita o uso de nosso salão. A honra sempre é em relação à graça com que a pessoa exerce o seu dom!

Lugar Seguro

Num capítulo do livro Cultura da Honra, o autor, Danny Silk, fala sobre a importância de criar um lugar seguro na igreja para que as pessoas sejam elas mesmas sem sufocar a obra de Cristo em sua vida. Precisamos crer que quem dirige a igreja é o Espírito Santo, e que o nosso papel como líderes é apenas ser facilitadores a fim de que ele faça a obra. Nossa interferência não deve sufocar a pessoa, muito menos a obra do Espírito em sua vida.

Nesse livro, Danny Silk trabalha com vários exemplos de como corrigir alguém sem que a pessoa duvide da obra de Cristo em sua vida. A ideia é trabalhar com a pessoa de modo que, ao final da conversa, saia dali sabendo que é amada por Deus e que nunca foi rejeitada pelo Senhor mesmo tendo cometido algum pecado ou erro que possa ter prejudicado a si mesma ou a outros irmãos.

Infelizmente, nossa história como igreja está cheia de pessoas feridas com a liderança pela forma com que foram tratadas com relação a seus erros ou pecados. Às vezes, nos ocupamos mais tentando “esfregar” na cara da pessoa o erro que ela cometeu do que nos preocupando com as consequências deste erro em sua própria vida.

É necessário trabalhar para que a igreja seja um lugar onde o pecador sinta liberdade para confessar o seu pecado, onde as pessoas não sejam forçadas a usar máscaras a fim de que ninguém as condene. Não seria melhor ter um ambiente onde as pessoas são elas mesmas e, se elas pisarem na bola, alguém chegue a elas sem diminuí-las ou envergonhá-las?

Conheço uma igreja onde uma irmã, muito dedicada, montou uma equipe de cozinha com o objetivo de servir a congregação em seus eventos. Para isso, precisou organizar a cozinha, fazer um levantamento de tudo o que havia naquele ambiente. Dentro de pouco tempo, algumas pessoas estavam reclamando de sua rigidez, da maneira como conduzia certas situações. O pastor, a cada reclamação que ouvia, perguntava: “Você acha que, se ela fosse diferente, as coisas funcionariam tão bem? Você acha que, se fosse ruim trabalhar com ela, sua equipe, que já está com ela há alguns anos, continuaria?”.

Dons de serviço sempre serão questionados. Alguém sempre fará algum tipo de observação a respeito da maneira como essas pessoas fazem o seu trabalho, mas elas precisam ser incentivadas a continuar o que estão fazendo, pois é a forma que têm para expressar sua espiritualidade e seu amor pelos irmãos. Às vezes, boas conversas e pequenas correções vão resolver situações com esses irmãos.

Três Dicas

Creio que precisamos guardar algumas dicas em nosso coração para não continuar cometendo alguns erros referentes aos nossos irmãos.

“Então, erguendo-se Jesus e não vendo a ninguém senão a mulher, perguntou-lhe: Mulher, onde estão aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou? Ela respondeu: Ninguém, Senhor. E disse-lhe Jesus: Nem eu te condeno. Vai-te, e não peques mais.” (Jo 8.10,11)

Primeira dica, o do mais fraco. Jesus não tratou aquela mulher segundo o pecado que ela havia cometido. Jesus a tratou como alguém que estava em fraqueza, sem nenhuma chance de defesa. Quando um irmão peca, está em fraqueza e não precisa ser condenado, mas sim exortado com amor a não pecar mais.

Quando o apóstolo Paulo quis exortar Timóteo, ele não falou sobre a fraqueza dele, mas o lembrou do investimento do Senhor na sua vida (2 Tm 1.6-8). Paulo incentivou Timóteo a despertar o dom que havia nele e trazer à memória o que lhe fazia bem. Nisso encontramos mais uma dica, a de trazer à lembrança das pessoas as promessas que Deus já lhes fez.

Em Apocalipse 2.5, ao chamar a atenção da igreja de Éfeso, o Senhor diz: “Lembra-te de onde caíste”. A igreja de Éfeso havia saído de uma posição nas regiões celestiais, assim como alguns de nós quando caímos em pecado. Nessas horas, precisamos de ajuda para retornar à nossa posição em Cristo.

No livreto Paradoxo da Solidão, o autor, Henri Nouwen, mostra a importância da empatia no ministério de Jesus. Sempre que uma pessoa se aproximava de Jesus querendo cura,

Jesus lhe perguntava: “O que você quer?”. Nesse momento, Jesus se identificava com a pessoa, trazendo humanidade para o momento com esse ato de empatia. Nouwen mostra que o profissionalismo do ministério de cura, atuando sem pessoalidade ou empatia, desumaniza o milagre que o Senhor quer fazer. Quando Jesus exigiu que a mulher hemorrágica que havia tocado na orla do seu manto aparecesse, estava interessado tão somente em olhar nos olhos dela e ter um contato pessoal (Lc 8.43-48). Creio encontrar aqui uma terceira dica, a da empatia. (Empatia é a identificação interior com a situação do próximo.)