6º Valor – Ministério ao Senhor

Harlindo Souza

 Outro nome que poderia ser dado a esta ministração seria: A relação entre o ministério ao Senhor e o ministério da Palavra. Falaremos primeiro sobre a importância do ministério da Palavra para depois falarmos sobre o ministério ao Senhor, que tem um papel essencial no desenvolvimento do ministério da Palavra.

A igreja é fruto da Palavra e não dos nossos programas, técnicas e modelos de liderança ou reuniões. Podemos perceber isso até na forma como Jesus lidou com o seu ministério aqui na terra. Ele não se preocupou, por exemplo, em dar diretrizes aos apóstolos de como fazer suas reuniões ou programas para atrair as pessoas, mas se preocupou em andar com os discípulos e transmitir-lhes uma palavra por meio da sua proclamação e ensino.

O capítulo 6 de Atos descreve certa confusão que ocorreu entre os discípulos a respeito da distribuição às viúvas que não estava sendo feita adequadamente. Ao serem requisitados para esse serviço, os apóstolos se negaram a fazê-lo porque sabiam que deviam dar prioridade à Palavra e à oração. Sendo assim, sugeriram que outras pessoas com dons apropriados fossem escolhidas para tal tarefa. Quantos de nós, pastores, por causa das necessidades que surgem na igreja local, temos abandonado a Palavra e a oração? Ao fazer isso, estamos deixando de providenciar para a igreja o essencial para que a vida de Cristo seja gerada nela. Negligenciando a Palavra e a oração, só nos restam nossas próprias habilidades para solucionar os problemas que a igreja enfrenta. Não entendemos que o nosso próprio braço não é suficiente para que a igreja viva uma vida sobrenatural.

No livreto Ministério ao Senhor, de Christopher Walker, há uma explicação clara a respeito da primazia do ministério sacerdotal em relação ao serviço levítico. Os levitas eram encarregados de cuidar do tabernáculo; tudo o que dava suporte para a adoração de Israel era efetuado por eles. Enquanto isso, os sacerdotes se preocupavam em ministrar diante do Senhor. Ao chegarmos à vida da igreja desde os tempos do Novo Testamento até hoje, muito do nosso trabalho ministerial tem a ver com o serviço levítico, isto é, com providenciar condições para a adoração e liderar as pessoas para que se comportem de forma correta. Porém, a nossa função principal deveria ser a sacerdotal. Os apóstolos, em Atos 6, entenderam que o serviço deles na Palavra deveria ser fundamentado no sacerdócio. E é nisso também que o nosso serviço deveria ser fundamentado, e não no pragmatismo e na necessidade humana.

“Não havendo profecia, o povo se corrompe; mas o que guarda a lei, esse é feliz” (Pv 29.18).

O povo, quando não tem visão, se corrompe, se deteriora. Às vezes, as nossas programações como igreja não se deterioram, mas a vida de Cristo que deveria fluir em todos os membros se torna cada vez mais escassa.

O que é ministério ao Senhor? De acordo com Atos 13, é o ato de reunir ministros da Palavra para que juntos, pela oração, adoração, comunhão, jejum e compartilhar da Palavra, possam buscar direção e visão para a obra de Deus. Em Monte Mor, temos usado a expressão “observação profética” para nos referirmos ao ministério ao Senhor. Ambas as expressões descrevem a mesma atividade, ou seja, pessoas dedicadas à Palavra se juntam para observar o que está se passando no nível do Espírito e esperar diante de Deus para entender o que precisa ser feito e, principalmente, o que precisa ser proclamado a fim de que a vida seja gerada cada vez mais no meio da igreja.

O ministério ao Senhor pode ser praticado diariamente ou semanalmente, mas o mais importante é que seja regular e constante. O grupo que se dedica a esse ministério deve ser o mais fixo possível ou sofrer mudanças mínimas, pois a constante rotatividade diminui o valor dessa prática. É preciso continuidade e perseverança se almejamos a construção de uma palavra profética. Pessoas novas podem ser acrescentadas e outras podem deixar de participar, mas é preciso haver um núcleo fiel que consiga perceber essa construção da palavra ao longo do tempo.

Quanto maior diversidade de dons e ministérios, melhor, mas ter maturidade é um requisito essencial para que alguém participe do serviço de ministrar ao Senhor. A imaturidade de alguns pode levar o grupo a perder o fluir do Espírito. Outra coisa é que pessoas imaturas podem se sentir ofendidas quando suas direções são rejeitadas. A pessoa precisa ter maturidade suficiente para entender que a sua palavra precisa ser recebida com unanimidade entre os irmãos, uma vez que o objetivo do grupo é encontrar uma palavra que o Espírito Santo esteja ministrando ao coração de todos. Pode ser que demore um longo tempo para que o grupo consiga sintonizar a frequência correta, ou seja, é preciso um trabalho minucioso para encontrar as bases que os une como ministros a fim de que possam começar a trabalhar a partir delas.

Ressalto que o objetivo não é convencer os irmãos da “nossa” visão, mas sintonizar-nos para entender qual é o nosso “mínimo denominador comum” e, a partir dele, começar a construir algo no Senhor. Isso gasta tempo, não só de reuniões, mas de diálogos, de comunhão e, principalmente, de um esforço para ver o outro com honra, percebendo o que Deus depositou em cada um.

O ministério ao Senhor não é o governo da igreja local, mas não deve estar alienado a ele porque há dons e ministérios diferentes que podem participar dos dois e contribuir para o surgimento de uma palavra profética. É trabalho do presbitério, do governo da igreja local, organizar, administrar e transmitir ao restante do rebanho, da congregação, aquilo que está sendo gerado no ministério ao Senhor. Por isso, ele precisa estar engajado em entender qual é a palavra profética para que ela possa chegar aos ouvidos da igreja e, assim, produzir o fluir da vida de Cristo.

Perguntas e observações para reflexão:

1ª – Quem deve estar dedicado ao ministério da Palavra?

A igreja local deve ter indivíduos dedicados à Palavra e à oração. Antes de receber sustento para dedicar-se a isso em tempo integral, o dom da pessoa precisa ser reconhecido pelos irmãos da igreja local. Isso significa que, por algum tempo, ela deve dedicar-se à Palavra e ser reconhecida como alguém que possui esse dom ao mesmo tempo que trabalha para o próprio sustento. Isso prova que o ministério é genuíno e não algo profissional ou artificial. Quando dois ou mais indivíduos na igreja local têm dom na Palavra, isso pode se tornar uma força sinérgica que libera visão para a comunidade. Uma palavra dinâmica que flui de um para o outro num relacionamento de comunhão se torna cada vez mais metabolizável pela igreja local. É no diálogo que se constrói a palavra profética, ou como dizem: “O melhor meio para fazer teologia é através de boas conversas”. Havendo apenas um na comunidade local, este deve dedicar-se a treinar outros de forma que haja uma multiplicação da palavra profética.

2ª – Qual é a relação entre proclamação e ensino?

A proclamação está relacionada a palavras mais proféticas que vêm para despertar a igreja, e o ensino está relacionado a palavras mais pastorais. A função do ministério da Palavra é:

1 – unir a Palavra e o Espírito de forma que a vida de Deus seja gerada na comunidade;

2 – transmitir uma visão que seja clara e molde o caminhar da igreja nos quatro níveis de visão (geral, atual, específica e individual, conforme o livreto Visão, de Christopher Walker);

3 – lançar as bases para um discipulado sólido a fim de que as pessoas saibam se portar como discípulos de Jesus.

3ª – Como formar novos ministros da Palavra?

Inserindo pessoas, chamadas para esse ministério, no ambiente de ministério ao Senhor. Esse ambiente vai treiná-las a:

1 – não se tornar ministros individualistas;

2 – ser atentas à voz do Espírito Santo para não transmitir apenas conhecimento; e

3 – respeitar e honrar os diversos dons do Corpo de Cristo. Nesse ambiente, os mais novos vão aprender como fluir com os mais maduros; e os mais maduros vão observar como os mais novos se movem, quais são suas contribuições (seus dons), como podem servir à igreja local e ao mesmo tempo crescer no seu ministério.

4ª – Como podemos lidar com as diferenças teológicas?

Acredito que o ambiente do ministério ao Senhor pode nos ensinar a lidar de forma saudável com as nossas diferenças teológicas. Vamos aprender a ter humildade e respeito mútuos, e a estudar com seriedade. É certo que muitos irmãos trarão assuntos novos, diferentes, e não se pode, simplesmente, rejeitá- los, mas dar espaço para conversar, estudar e ver se realmente aquilo é uma palavra que Deus está liberando ou se é algo que não se deve abraçar. Isso precisa ser feito num ambiente onde o amor e a verdade são prezados acima de tudo. As nossas diferenças teológicas só vão ser resolvidas, ou no mínimo, não vão se tornar uma barreira ao nosso avanço, se tivermos paciência para caminhar a partir daquilo que Deus mostrou a todos, onde há concordância. Devemos ter paciência para entender qual é o caminho pelo qual ele quer nos guiar e não o caminho que nós mesmos queremos impor aos outros. Precisamos dar passos dentro daquilo que é possível, e o possível é tudo o que Deus está falando conosco de forma coletiva e unânime.